Visitas de estudo às “Vilas Operárias” da Graça e zona envolvente

O percurso teve início na Escola Oficina nº1, compreendeu a visita ao interior da Igreja da Graça, às “Vilas Operárias” e aos espaços envolventes até ao Beco do Salvador.

Para além da historicidade que se encontra esboçada nas edificações e que se materializa em “espaços sociais”, embora com fraca visibilidade, existe a possibilidade de se fazer uma leitura dos correspondentes “estilos de vida”.

Estilos que foram construídos pela incorporação de valores, de padrões e de comportamentos que caracterizaram a vida dos antigos moradores (“classes laboriosas”) dessas mesmas vilas.

Neste sentido, transmitiram-se instrumentos teóricos que possibilitassem a leitura desses espaços, tendo-se indicado algumas singularidades sobre os signos que constituíam representações simbólicas.

Foi uma tentativa, bem conseguida, de produzir um maior interesse pela descoberta que, numa investigação objetivada no âmbito do turismo, contivesse as dimensões social, política e económica.

A emergência destes espaços habitacionais encontra-se, ainda pouco desenvolvida, na história da cidade de Lisboa.

Estava ligada, por uma lado, à “questão de se encontrarem soluções para as graves situações de alojamento das então chamadas classes laboriosas [que] foi [fora] objeto de um debate que se foi pouco a pouco alargando no último quartel do século xix e nos primeiros anos deste século [séc XX].

O Inquérito Industrial de 1881 chamou a atenção para o assunto, pois revelou a miséria das condições de habitação do operariado nos principais centros industriais do país, com relevo para Lisboa, Porto, Covilhã e Setúbal.

O crescente afluxo de populações a estes centros, provocado por um surto industrial que se desenvolveu com o fontismo, não encontrou correspondência nas condições de habitação para este aumento demográfico” (Pereira, 1994: 509).

Por outro lado, a construção das “vilas” podia estar coligada, para além das questões da rentabilidade económica, a uma “construção de habitações para o pessoal [que] poderia inscrever-se numa atitude de tipo paternalista por parte dos empresários, promovendo imagens como a «grande família» e a «dignificação do trabalho» e não deixando certamente de funcionar como instrumento de controle e de pressão sobre os assalariados” (Pereira, 1994: 518).

Contudo, existe a particularidade da Vila Agapito Serra Fernandes que tem a moradia do proprietário localizada na zona central dos arruamentos, numa aproximação aos seus operários (da industria da panificação) com um investimento que, dentro de um carácter filantrópico desenvolvido por alguns industriais e proprietários da época, foi até à construção do Cinema Royal cujo objetivo era a fixação dos trabalhadores, nos seus tempos livres, à zona residencial.

O mesmo se encontrava patente na diversidade dos estabelecimentos comerciais, o que permitia uma vida acomodada ao local da habitação dos operários e dos outros trabalhadores.

Todas as habitações, na qualidade do desenho, na diversificação das tipologias e no cuidado do seu arranjo reproduziam, naturalmente, a hierarquia que existia dentro do trabalho.

O grande objetivo da visita foi evidenciar as potencialidades do turismo para o encontro da “veracidade”, a possibilidade da criação de novos percursos turísticos, com a indispensabilidade da “autenticidade” histórica, onde se torna fundamental a investigação – porque nem todas as vilas são destinadas ao operariado – e a necessidade do “respeito pela diferença”, dentro de uma articulação de interesses que compreenda a satisfação das aspirações dos visitantes e dos visitados.

Nota: uma síntese bibliográfica sobre a nossa visita

  • Fortuna, C. (1999). Identidades, Percursos, Paisagens Culturais. Oeiras: Celta
  • Pereira, N. (1994). “Pátios e vilas de Lisboa, 1870-1930: a promoção privada do alojamento operário” in Análise Social, vol. xxix (127 – 3.°). (pp. 509-524).
  • Pereira, N. (1994). “Vilas Operárias” in Dicionário da História de Lisboa. Sacavém: Carlos Quintas e Associados, Lda (962-964).
  • Pereira, N. & Buarque, I. (1995). Prédios e Vilas de Lisboa. Lisboa: Livros Horizonte.
  • Pires, J. (1998). Lisboa. Livro de Bordo. Vozes, olhares, memorações. Lisboa: Publicações Dom Quixote.